Crônica de um neurônio abandonado
Gostaria de ser complexo, assim, profundo mesmo. Escrever textos que precisam ser relidos, estudados, situados em espaço e tempo, racionalizados, textos intrincados e filosóficos. Mas de verdade mesmo! Artigos para poucas pessoas entenderem. Não pense que sou simplório por escolha. Não senhor. Eu estudei, li muito, li de tudo, li todo o tempo. Kafka, Homero, Freud, Camões, Nietisch, Jorge Amado, revistas MAD. E muitas mais variações, muitas mais mesmo! Mas não foi só isso. Aprofundei-me na sétima arte. Desde pequenas produções independentes à arrasa-quarteirões. Nacionais e Internacionais. Cinema francês, japonez, chinês, argentino. Aprendi a apreciar também a música, todos os tipos, muitas variáveis e muitos sons diferentes. Cazuza, Beethoven, Ozzy, Kurt, Morrison, Chico Buarque, Rita Lee, Joni Mitchels, Fergie, David Gilmour. Tudo o quanto pude eu coloquei dentro da minha cabeça. Garimpei grandes raridades e engoli também muita criação da mídia. O meu raciocínio é rápido e de certa forma lógico. Posso debater com argumentos sólidos política, religião, arte e até alguns esportes. Honestamente - considero a minha mente privilegiada pelos bons tratos e pelas liberdades que a concedo. Mas sou simplório. Não consigo escrever uma única maldita linha profunda. Nenhum aforismo que perdure. Nenhuma filosofia real. Nada que se gaste mais que um segundo para entender e sobretudo compreender. Nem quando tento ser vago, poéticamente vago, quando tento confundir por querer, criar desconexos pra valer, nem assim aprofundo. Eu sou um prato razo. Uma poça que sonha oceanos. Acalmem-se, a única coisa eterna nos simplórios é a esperança, ainda há de acontecer. A profundidade há de acontecer. E neste momento, quanto atingir o abstrato incógnito, pararei de escrever.
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